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Biografias de Poetas e Poetisas |
Erorci Santana (Erorci Ferreira Santana) nasceu aos 23 de junho de 1960, no distrito de Penha do Cassiano, Comarca de Governador Valadares/MG. Radicado em São Paulo desde 1974. Cursou Letras com orientação para a tradução e interpretação da língua inglesa na Faculdade Ibero Americana de Letras e Ciências Humanas, em São Paulo. Associado da UBE – União Brasileira de Escritores, desde 1984, exercendo cargos na direção daquela entidade nos biênios posteriores a 1996, na qualidade de diretor e secretário-geral. Atualmente, exerce o cargo de diretor e, cumulativamente, editor do jornal O Escritor da UBE. Poeta, publicou as obras em livro: Carnavras (Edição do autor, São Paulo, 1986); Estatura Leviana (Edição do autor, São Paulo, 1989); Concertos para Rancor (Scortecci Editora, São Paulo, 1993) e Maravilta e outros cantares (Alpharrabio Edições, Santo André/SP, 2001). Coordenou oficinas de poesia na Oficina Cultural "Luiz Gonzaga" e é membro da comissão julgadora do Mapa Cultural Paulista, categoria Literatura, desde a edição 2000, ambos projetos da Secretaria de Estado da Cultura, em São Paulo. Coordenou o Encontro Nacional de Arte e Cultura, realizado pela UBE e sediado na cidade de Registro/SP, em 1989, com o concurso de expressivos intelectuais e artistas de todo o Brasil. Editou a revista Artaud’Art, em consórcio com o DCE/USP. Colaborador regular do jornal literário Linguagem Viva e de Literatura – Revista do Escritor Brasileiro. Funcionário do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. É casado com Solange de Oliveira do Nascimento Santana e pai de Bruno e Beatriz.
[Leia a poesia Maravilta e outros cantares, de Erorci Santana, publicada na Casa da Cultura]
Os Cantares de Erorci Santana
(Crítica de Fábio Lucas)
Maravilta e outros cantares de Erorci Santana constitui uma coleção de poemas de complexa contextura, quer do ponto de vista formal, quer quanto à fundamentação temática. O leitor sentirá, de início, certa mistura de vozes, pois ao mesmo tempo em que capta determinada elevação do tono poético, percebe uma tendência diversa de agremiação da linguagem popular. O poeta aplica-se a um estilo do discurso (genus dicendi) em que se dá curso ao misto de acuta eloquentia com o sermo vulgaris, pois ficam entrelaçados a concepção conceitual e difícil, com o diapasão popular, ou dicção liberta de convenções retóricas.
Mas o que sobrenada são as artimanhas estilísticas, acompanhadas da inevitável pulsão emocional e até, por vezes, certo empenho cognitivo. Fartura imagística repousada em versos longos, sonoros. O exemplo vem de Homero, pois um dos predicados de Ulisses foi a facúndia. Mas, no caso de Erorci Santana, vê-se o primado da emoção evocativa e dos versos carregados de intenções críticas. A elegância da linguagem advém das metáforas e dos jogos de palavras que se inclinam para a beleza, a harmonia e certo ar de estranhamento. Além do mais, o poeta constrói os versos com alto nível rítmico, o que concorre para seu poder majestático, com o objeto de comover.
Na construção da força dramática, Erorci Santana tanto explora a função representativa, quanto a função expressiva. No primeiro caso, tematiza "a cachorra inerte" (poema XXXIII), o noivo fatalizado (poema XXI) e o velho sem remissão (poema XXXI); no segundo, de função expressiva, mencionemos o poema XXXVI, que inclui emoção e reflexão. Talvez uma arte poética do poema agônico.
Há mais a comentar na linha temática e na realização literária do poeta. Nota-se, adjunto ao efeito crítico, o retrato da ruína cultural em que a poesia se insere. O poema IX exprime o lado grotesco e comovente da sobrevida de fantasmas cultuais arcaicos. Mais vivo ainda na postulação do choque cultural é o poema XX que, em contraste com o "mugido de vacas prenhes", de reminiscências rurais, diz: "Hoje, convivemos/com vacas mecânicas, cópulas cibernéticas,/ enquanto vão morrendo a madressilva, o malvarisco/ e se perde na fuligem o horizonte solitário".
Ao trazer o mundo contemporâneo à sua poesia, Erorci Santana não se desgarra do canto nostálgico, como a sacramentar o peso de uma perda irremediável. Mesmo a face lírica de Maravilta e outros cantares está impregnada de ausência. Veja-se a dimensão confessional ao fim do poema XXV:
"Oh, eu desisti de procurar-me! Aceitei minhas facetas,
como o mar aceita o sargaço e o naufrágio,
adotei as circunstâncias do meu cerzido drama.
Minha raça é uma só: humana.. Sua cor variegada
salta-me das órbitas, dos poros iridescentes.
Aqui toda beleza é poço, embuste, arma, ilusão,
lugar onde as amazonas cavam sua própria rendição."
Cabem aqui alguns comentários sobre a dimensão lírica dos poemas, tão carregados de lamentos de teor biográfico. No inferno dos namorados contemporâneos, há uma rejeição do verbo alto, dos ditos engenhosos (Aristóteles), das boas palavras (ou esteia), dos cumes da expressão apaixonada. Antes, se degradam o amor e a palavra.
Do período Medieval ao Renascimento, havia a dualidade do Cuidar (cuydado triste damores) e do Suspirar (Os sospiros sam escumas/ que cuydados botam fora). O primeiro trazia a noção de sentimento interior, de dentro do coração, em que se manifesta a sacralidade do amor; o segundo, Suspirar, traduz a expressão para fora, exterior, a colher os arredores profanos. Os cancioneiros de Garcia Resende retratam a dualidade Cuidar/Suspirar, em que o cogitare fica do lado da meditação, enquanto o Suspirar ocupa o lado do sofrimento.
Nos poemas de Erorci Santana surpreendemos um lirismo agônico, de tal sorte que a evocação da amada traz consigo sentimentos de nostalgia e de impossível retorno. E como é garantida a poeticidade?
Além dos recursos fônicos, apoiados em aliterações, paralelismos, contrastes e paranomásia, o poeta enriquece a sua orquestração simbólica com o recurso da repetição intensificadora, ou seja, a annonimatio ou repetição com polissemia. Assim, o poema II está ligado ao XXXVII pelo verso inicial de ambos: "Se a poesia está morta eu não sei."
O poema primeiro, "Apologia do canto", assim como o III, que principia por "Se a poesia está viva eu não sei", refletem um grau de esperança no poder da palavra e na permanência da poesia. Mas entram em contradição com o XXXVII, que fala dos "trapos fônicos" e puxa para certa descrença. Que diz da poesia? Vejamos um trecho:
"Viva ou morta fez-se ancila
de bastardas expressões,
de miseráveis arremedos da beleza,
camuflagens, trapos fônicos
desses tempos desbotados e vazios."
A seguir, prossegue o poema:
"Seu olhar é vítreo como o das salamandras,
seu dorso está coberto por antigos vespertinos.
A fuligem e o pó de suas vestes
parecem indicar que a Poesia
andou queimando lata no canteiro de obras."
O poema XXXVI é muito significativo na coletânea. Anafórico, insiste nos versos introduzidos pelo conector "se", a indicar construções condicionais hipotéticas. São cláusulas de dependência semântica com uma frase sempre ausente. Tempo lingüístico que exprime uma modalidade não factual, pois dependente de uma ação impraticável.
O importante, a nosso ver, é o clima de indeterminação em que o poema se apresenta e cresce, Mais uma vez a metalinguística se externa, pois o poema também contém uma arte poética, uma reflexão sobre a força da palavra e a pulsão da vida.
Como as reminiscências culturais ilustram boa parte dos poemas, seja-nos permitido referir mais um aspecto de Maravilta e outros cantares: tendo a infância do poeta se passado em Minas, o poema XV ilustra alguns toques ancestrais do Estado, com alguma originalidade. Deste modo se inicia o poema:
"Quando Deus secou o mar de Minas
procurando o seu relógio digital,
revelou-se o monte Ibituruna.
E o filete d’água que restou, fluindo
em seu sopé, "Doce" foi chamado por Adão,
quando, a caminho do exílio nele sua sede saciou."
Adiante, o poema se remete à condição de mineiro, para enfatizar, no poeta, o se lado conturbadamente intimista. Assim, os bardos...
"Ostentam nos olhos a única riqueza
herdade em Minas: a firme determinação
de vencer sem pressa e sem dor os únicos
inimigos que na vida vale a pena combater:
a si mesmos."
Não obstante o tom elevado com que certos poemas se realizam, fica a impressão de que o poeta prefere a dicção popular. Optou, tematicamente, por tudo aquilo que floresce distante das cortes. Daí confessar, no poema VI: "(...) e ingressei nessa fantástica/ abstração chamada povo. "
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