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Ainda que sua consciência não fizesse ‘ponte’ com suas lembranças, continuava sendo como uma pessoa do século XXI num contexto histórico que não seu original.
Desmaiado, após a materialização do traje em um ponto sobre o mar, se deslocando rente à costa africana, foi assim que o operador acabou sendo conduzido na direção de seu destino. Em todos sentidos.
O traje não precisava de nada além do circuito feedbeck para constatar que sua carga respirava tranqüilamente, embora inútil, em seu móbile desativado. Rastreadores, sensores topográficos, de calor e relés impotrônicos se encarregavam de transportá-lo para um determinado trecho duma ilha que crescia rapidamente a frente.
Expulsando-o de suas entranhas, começava o processo delicado (e ‘constrangedor’) da ejeção do operador desmaiado pela eclusa de emergência: ligeiramente curvado, as poderosas rótulas do traje-robô também flexionadas, pernas unidas, hastes de apoio fincadas no solo conferindo estabilidade, o metálico e imenso tronco sem cabeça assumiu a posição de ‘defecar’, expelindo seu passageiro com segurança pela rampa anal, deixando-o a quase cem metros duma exígua guarnição espanhola que, terminado todo processo insuspeito, saiam, cantarolando ruidosamente, de certa taverna local.
Independentemente do desmaio – natural em viagens temporais -, tudo o mais já fora precisamente calculado. O robô andarilho descarregara seu ocupante juntamente com algo que possibilitaria um melhor entrosamento deste com sua missão. O resto não dependia da presença física do traje-robô para fluir.
- Olha aquele conterrâneo! – apontou um dos guardas, trazendo seus camaradas, também bêbados, para próximo do marinheiro aninhado junto a uma moita, tendo um galão de aguardente esvaziado ao seu lado. - Está quase no instante da frota partir e esse idiota arruma a pior altura para desmaiar de tanto beber!!!
- Ele é que está certo – apontou um cabo, apoiando a arcabuz no tronco duma árvore, checando para ver se dentro do garrafão sobrara algo para molhar sua garganta. – Dê só uma olhada nas dragonas e nas cores. Reconhecem? Seguirá na vanguarda. Você também encheria a cara como um gambá para esquecer que está indo pra morte...
- Que ninguém o ouça falar assim, Sanches! – advertiu o colega mais jovem, após inúmeras tentativas de acordar o marinheiro terem falhado, carregando o fardo na direção onde os cavalos estavam arreados junto ao celeiro. – O Pontífice têm ouvidos em toda parte.
E benzeram-se, por vias das dúvidas, provando a ‘santidade’ de seus pensamentos.
Jogando o marinheiro no dorso da mais possante das montarias, seguiram ao trote e finalmente à galope na direção da estrada que daria direto no porto de Messina, na esperança de poder entregar sua mercadoria e receber, talvez, alguns cobres em troca!
Estava em cinquecento (século XVI); era o ano de 1571, mais precisamente na noite de 16 de Setembro. Tochas ardiam por todo molhe e em diversos pontos da grande ilha situada na ponta da bota italiana, tendo o mar jônico pela frente e o mediterrâneo logo abaixo.
O espetáculo prometia ser impressionante!
A Tríplice Aliança, chamada de Liga, após numerosos retrocessos, estava finalmente formada. Punha-se em marcha no mar, em pares, num festival de cores à saída do porto de Messina, rumando para a guerra, onde quer que ela estivesse: 200 embarcações e 50 mil infantes espanhóis, italianos, alemães, o que mais houvesse por lá.
Na frente do ‘Combóio da Fé’ seguia o comandante dos espanhóis, Andrea Doria, trazendo flâmulas verdes no topo dos mastros de suas 60 naus, sendo seguido de perto pelo que seria o núcleo da esquadrilha, estampando bandeirolas azuis, o Gonfalão de Nossa Senhora de Guadalupe içado na nau do generalíssimo dos exércitos cristãos – e irmão bastardo de Felipe II, monarca da Espanha -, o jovem D. João d’Áustria; à direita do Centro, ou Batalha, como era referido o núcleo da formação, via-se o chefe da esquadra auxiliar pontifícia, Mario Colonna, no comando da nau-capitânia do Papa, e à esquerda do Centro partia o experiente e septuagenário veneziano Sebastião Veniero, sendo acompanhado pelas flâmulas amarelas da divisão de Veneza, no comando do nobre Barbarigo. Na retaguarda de tudo, portando bandeiras brancas, o Marquês de Santa Cruz, D. Álvaro de Bazán, encerrando o cortejo naval.
Todos Cruzados em cada navio, após receberem do Núncio Odescalchi, enviado de Pio V, algumas partículas do Santo Lanho, ouviram dele a exortação à vitória, além de, devidamente ajoelhados, as bem-vindas benções do enviado papal, estendendo-se também às suas embarcações.
Enquanto a Praga ainda se arrastava em boa parte da Europa, inclusive expandindo seus tentáculos na direção da esquadra veneziana que se dirigira separadamente para aquele lugar, os otomanos - por muitos considerados como um outro tipo de doença terrível - avançavam na direção de Chipre, a sitiando, dando sinais que em breve a tomariam.
Quando o Doge de Veneza e Felipe II finalmente acertaram seus ponteiros, fazendo da esquadra conjunta uma realidade que seguia na direção do leste, Aretuza acordou com uma bruta enxaqueca temporal, por instinto procurando pressionar com o polegar direito um ponto específico em sua têmpora esquerda, trazendo-lhe alívio imediato.
Estava num compartimento cheio de sacos de batatas e frutos contra o escorbuto, logo, por dedução, só podia ser a dispensa de algum lugar, provavelmente um navio.
À entrada de um gordo ajudante, vendo o marinheiro ocioso esparramado em cima de seus víveres, estranhamente facultou-lhe uma ocupação na cozinha. Sobressaindo-se de tal maneira, mostrando um serviço bem feito no preparo de alguns bolinhos e pratos que ninguém nunca provara - mas todos ovacionaram -, renderam do chefe da cozinha sua indicação para o serviço dos oficiais. Uma ocupação por demais honrosa e principalmente leve, em relação à estiva e outras.
Assim, o destino acabara de garantir o acesso a algumas informações que dificilmente obteria de outra forma.
Tinha consciência de que era mulher, mas sua doutrinação fora completa e aceitava sua vestimenta masculina, e tudo que vinha junto com ela, inclusive os pêlos de seu peito e rosto, afixados de forma indelével e temporária, além do principal ‘detalhe’ em sua anatomia pseudo-masculina: uma prótese peniana camuflando perfeitamente seus lábios vaginais, podendo ser usada sem receio no ‘mictório público’, trepada na mureta, tal qual muitos outros, e descarregando no oceano sua contribuição pessoal em termo de líquido. Mijo e água salgada, o vento espalhando tudo, fatalmente reservava gotículas nos lábios de alguns tripulantes, havendo sempre alguns idiotas, contentes, saboreando isso como se fruto da maresia
Se viveria como macho da espécie por mais de 15 dias, em especial em alto mar, onde o significado da privacidade não existia para todos que não fossem oficiais, aquilo tinha que ter algum motivo. Porém o tutor, implantado em sua cabeça, que fazia interface com seu cérebro através de dendritos artificiais, se encarregava sutilmente de fornecer uma série de ilusões que faziam-na embarcar com todos os sentidos, como em uma espécie de sonho numa montanha-russa de sensações. Estava sendo tapeada a partir de dentro e, para uma doença ruim, nada como um remédio eficaz, que ainda carecia de invenção, para restituir sua liberdade. Enquanto isso, permanecia um marionete sofisticado, num lugar muitos séculos antes de seu nascimento.
D. João prosseguia em suas medidas de moralização, no que imaginava preservar o caráter sacro da incursão. Não exatamente no que dizia respeito à pena de morte para quem blasfemasse ou o cumprimento de três dias de jejum e obrigatoriedade da confissão para todos, sem exceção. Nada disso tinha perdido valor, se bem que fosse contornado com o devido cuidado por alguns teimosos participantes. Porém, no que tangia à primeira de suas medidas moralistas - aparentemente a mais fácil de se cumprir no mar, banindo a presença de mulheres a bordo - tinha sido burlada desde o início!
Aretuza, de serviço na cozinha, sem gingar ao andar, sem distúrbios hormonais que pudessem atrapalhar sua performance, seguia com um grande e pesado tacho de prata, levando biscoitos recém fornados para um dos camarotes, quando uma voz fez com que diminuísse a cadência de seus passos.
A gravação daquele período histórico já tinha se iniciado, o traje-robô voando bem acima das nuvens, gerando horas e mais horas de relatos concisos e ininterruptos. As imagens seriam montadas depois por toda deferência de técnicos e sonoplastas que não se cansavam em enxergar épicos em qualquer coisa. Seu implante tutor já tinha também identificado aquela voz na fração de segundo que gastou para finalmente se imobilizar.
Era o alvo!
D. João d’Áustria estava além daquela porta.
- ... o Estandarte da Liga está comigo e logo nós faremos a Bandeira de Cristo drapejar no mastro da capitânia desses detestáveis ímpios!
- Quando pensa que haverá contato com eles e o que podemos esperar em termo de resistência, senhor?
Oculta do outro lado da porta do camarote, ela ouvira de alguém, que não saberia precisar quem, talvez o Escrivão, dirigindo-se a uma 3a pessoa, o timbre de voz, passado pelo modulador e traduzido pelo tutor, identificando-o como o comandante da esquadra espanhola, Andrea Doria, prosseguindo a conferência ao asseverar:
- Chegará a qualquer momento um mensageiro ou algum de nossos batedores com informações mais precisas sobre tudo isso.
- Exato! Todavia não convém nos amofinarmos por enquanto, pois o inimigo pode usar isso contra nós – aconselhou D. João, seguido de um barulho que parecia uma portentosa dentada em algum fruto cítrico. – Aguardaremos os próximos dias deixando o fio de nossas espadas tão aguçados quanto nossa Fé!
Aretuza, na pele de um marinheiro, pela aproximação de alguns guardas, foi forçada a continuar em frente, indo entregar os biscoitos frios onde de certo não seriam lá muito apreciados. Em oposição, pela informação que recebia, ela não tinha nenhuma queixa a fazer, exceto a brevidade da mesma.
As galeras venezianas espalhavam-se no mar atrás da nau-capitânia, como cardumes no rastro duma baleia: Não necessariamente vivendo de suas sobras, mas oferecendo proteção adicional para quando fosse necessário. Aquelas embarcações estavam com os dias contados, mas ainda não eram tão inteiramente obsoletas. Evoluíram das liburnas romanas, mantendo aquela proporcionalidade em relação ao seu eixo longitudinal e largura de 8:1 (tinham em média 55 metros de comprimento por 6 de largura e 2,5 de profundidade), além da coberta única, com castelos de popa e proa, estando instalado no castelo avante a principal bateria de canhões. No combate - e o próximo comprovaria a eficácia disso - quase exclusivamente os remos a moveriam, dispondo de, algumas, um 2o mastro além do original, instalado no centro. Algumas poucas galeras apresentavam-se com um curioso terceiro mastro à ré, sendo que o mastro de traqueamento, o de vante, é que segurava a vela mestra.
Informações que ela dispunha, choviam de sua mente, só não sabia como e por quê.
Permaneceu assim por longo período, entre os afazeres na cozinha e rondas pelo navio, ‘ouvindo’ mais dados ainda de sua mente incansável:
A capitânia do irmão bastardo do rei, no entanto, apresentava uma traça bastante mais sofisticada. Essa nau grossa deslocava quase 500 tonéis, tinha casco e costado reforçados, vergas maiores que as convencionais, sendo sua superfície externa mais alta na proa. Em sua grande área triangular de madeira de lei, encimando a grinalda-de-popa, sobressaia uma haste de madeira, projetada de forma oblíqua para trás e para o alto, na qual as lanternas de navegação e a bandeira se aferravam na estrutura. Era ali o local mais bem arejado da nau, constituindo o melhor refúgio contra eventuais tiros de canhão, estando, em contrapartida, o castelo-de-proa, como local de trabalho, freqüentado pela marujada subalterna, exposto diretamente a toda sorte de tiros do inimigo.
Havia necessidade daquela nau ser assim tão robusta: carregava um peso-morto de quase 200 toneladas, traduzido nas várias bocas de canhão que, individualmente, pesavam na faixa de três mil quilos. Ao se adicionar o peso da munição, ter-se-ia idéia do espaço e peso tomados à chamada carga útil da embarcação e, principalmente, um quadro bastante negro, mesmo com a vela enfunada e um bom piloto-mor para usar o vento a seu favor, dos galés abraçados aos remos como pequenos motores feitos de músculos e suor.
Já tinham se passado mais de duas semanas desde a partida de Messina. Chipre, o nome derivado de kypros, palavra grega que significava cobre, povoava a lembrança de praticamente todos a bordo da esquadrilha. Cobre, ferro, metal fundido, força, família, herança, tradição, agora, quem sabe, em poder do inimigo. Mas não era para lá que a bússola apontava nem a balestilha se inclinava: Lepanto, esse era o nome do lugar, um porto tão traiçoeiro quanto insignificante, nas águas mais ao sul, passando por um estreito que possuía o mesmo nome, ligando o golfo de Patras ao de Corinto.
O local onde a esquadra turca aguardava o momento tão esperado de medir forças com a cristandade.
Com ainda a imagem da ilha de Chipre, antiga base dos cruzados, ecoando em seus corações, a ave do agouro trouxera notícias nada alvissareiras naquele 6 de Outubro fatídico, que reportava a conquista da capital da ilha sob o julgo dos infiéis. Os detalhes sórdidos foram poupados dos ouvidos da ralé guerreira, pois sabiam-se facilmente influenciados por maus presságios; aos oficiais e nobres (e aos ouvidos indiscretos de certa clandestina), nada foi omitido: Mustafá, general do Crescente, se pavoneava como o novo ‘dono’ do lugar, provocando uma comemoração à altura daquela apreciada presa de guerra. Após algumas noites de terrorismo contra a população cristã, algumas tantas, muitas, várias sevícias e profanações de túmulos da igreja católica, mandara, como pináculo de seu ódio, esfolar vivo o comandante da praça, Marco Bragadino, socando feno em sua pele retirada por inteiro, depois de devidamente estripado, fazendo-o, costurado, circular por toda Famagusta, em sinal de ofensa declarada. Estava lançado o desafio. E claro, como uma bofetada numa Justa, fora aceito!
No dia seguinte, quando era iminente a chegada da frota à Lepanto, D. João circulara entre as naus, visitando seus comandantes, instigando-os ao revide, formalizando um pacto mortal: ou faziam o inimigo pagar por tal afronta com ao menos igual ferocidade e semelhante falta de complacência, ou nenhum deles voltaria a ver a Europa e seus parentes novamente...
Céu carregado de tão cinzento, névoa fria e vento úmido foram as intempéries que encontraram pela frente, antecipando a tomada de posição para o combate.
Mas no Domingo, lá pelas duas da madrugada, houve uma mudança satisfatória: vindo do poente, à barlavento, um alísio fresco espalhou todas as nuvens de chuva, dissipou a névoa que escondia o inimigo, limpando o céu, num prenúncio de bom tempo para o dia que se avizinhava. Um bochechudo Éolo, saído diretamente das iluminuras dos artistas, poderia muito bem estar ali, soprando aqueles alíseos!
Os preparativos foram longos, extenuantes e necessários, de ambos os lados. Ofensas e injúrias, trazidas pelo vento, partiam das naus turcas, desdobrando-se para tomar conta do oceano, enquanto munições eram acondicionadas em seus locais respectivos e a exortação ao Combate por Jesus ultimava, da parte dos cristãos, a misturarem idealismo religioso com a arte militar. A destruição dos focos de salugem nos canhões provava sua eficácia: não se desmantelariam quando mais precisassem deles!
Antes mesmo do dia raiar, as naus dos cruzados, levantando ferros, adentraram totalmente no estreito de Lepanto, o inimigo a menos de uma milha náutica. Formação de batalha assumida, troando os canhões para saudar o estandarte da Liga que aparecia pela 1a vez, subindo ao mais alto dos mastros da nau-capitânia, eles desafiaram os infiéis.
Ao ajoelhar do Príncipe, todos ecoaram de igual maneira, começando a rezar. Todos, menos Aretuza, que estava porém agachada num canto, o coração disparado, narinas dilatadas, sentindo no ar que o momento se aproximava. Até ali a História correra em conformidade mais ou menos com os livros. Depois de sua intervenção, novas brochuras teriam de ser compiladas...
E foi justamente o tiro de Ali-Pachá, o almirante otomano, que precipitou o caos!
Adiantando o resultado, poder-se-ia dizer que a vitória em Lepanto, pelos cristãos, não ocorreu. Naquele primeiro movimento de Ali, chamando os europeus à luta, por algum motivo, este não fora respondido.
A história estabelecida dizia que houvera uma mudança súbita na direção do vento, que antes dificultava o avanço do exército cruzado, obrigando o uso dos remos, extenuando os galés. Dizia também que, em seguida ao primeiríssimo tiro dado pelos cristãos, favorecidos pelo vento, com mira fulminante e inspirada, afundara a 1a galera turca.
Ambos acontecimentos não se verificaram, muito pelo contrário...
A cisma de permanecerem imóveis deu aos muçulmanos a impressão de falta de brio e, sob sons de cornetas, címbalos e movimentos de cimitarra, a vociferação "esses cristãos vieram como um rebanho para que o degolemos!" foi impossível de ser esquecida por aqueles a quem destinavam. Promessa feita, a ordem dada por Pachá de não fazer prisioneiros espalhou-se como fogo em óleo, passada de boca em boca, pronta para ser posta em execução. Cabeças contavam pontos. Mal sabiam que estavam inventando um dos default do video-game.
Os escorpiões do Mediterrâneo, como os ‘hereges’ chamavam a Ordem de S. João de Jerusalém, tinham, com sua inação, acabado de provocar a primeira de uma série de ferroadas contra si próprios.
Ainda sob o alarido, mais de duzentas bocas de canhões abriram fogo simultaneamente contra a esquadrilha, sendo que a Sultana, a nave de Pachá, desprezando a aglutinação de seu quieto adversário, favorecida pelo colírio que eram dois navios sendo postos a pique pelos canhões, avançava resolutamente pelo centro da formação cristã. Usava de sua superioridade numérica para infligir mais alguns estragos, desdobrando-se, esperando envolver também os flancos do adversário com o movimento de pinça.
O medo tivera sua razão de ser.
Aquela letargia se originara na cena terrível que todos católicos viram por sobre os mastros dos soldados de Mafona, a esquadra otomana; a imagem dum ’leão’ com garras de cimitarra, a juba parecendo um sol flamejante, deixara atônitos e amedrontados, não necessariamente nesta ordem, todos aqueles que testemunharam aquilo que nada mais era que o traje de Aretuza usando ‘de um de seus efeitos especiais’, na forma de hologramas.
Quando Doria percebeu a armadilha na qual estava entrando e despertou lentamente do transe induzido pelo medo, praticamente não pode fazer muita coisa. A reação fora lenta e desordenada pois não dependia somente de si, e sim o conjunto de sua frota, em graus diversos de prostração; muitos navios já soçobravam em piras ardentes sobre as águas e os infernos se abriam para engolirem novos inquilinos.
Navegando à bolina, isto é, o mais próximo possível à linha do vento, mesmo assim Doria foi engolfado pelo inimigo.
Aproveitando-se da derivação de Doria para longe da zona que lhe tinha sido estipulada, deixando uma brecha enorme entre a ala sob seu comando e o núcleo da esquadrilha, o apóstata italiano Uluch, mercenário mais do que oportunista, avançou suas galeras, especialmente as mais pesadas e bem armadas, neutralizando o comandante dos espanhóis, dando-lhe trabalho e não deixando-o retornar a sua posição original.
Caíam, uma após outra, as tropas de Andrea Doria, sem que a reserva de D. Bazán, o Marquês, pudesse mover um único remo para socorrê-las, estando este empenhado em prestar auxílio aos venezianos da ala oposta, nas proximidades do litoral.
Assim desprotegida - o almirante turco, reconhecendo a fragilidade e o momento propício na dispersão do inimigo, principalmente identificando os estandartes da Liga na galera que presumia, acertadamente, ser a de D. João - fez sua Sultana seguir a todo pano. As águas cediam espaço à veloz embarcação.
O choque de proa contra proa dos dois navios foi terrível. Sem que soubessem como, onde ou por quê, de uma hora para outra, perante a estrondosa gritaria de inúmeros janízaros, instigados por Ali-Pachá em pessoa, a abordagem tivera início!
Quando mais dez galeras turcas se juntaram ao combate, aferroando-se à grande presa, o tombadilho da nau-capitânia ficou todo tomado. Partiam tiros e golpes certeiros de espada contra os rivais, não medindo esforços para que o oponente otomano batesse em retirada, com a certeza que aquilo não seria fácil, já que sabiam que o aço de suas cimitarras já tinham bebido sangue, visitado entranhas e, primordialmente, se alojado nas mentes dos cristãos.
Aretuza assistia a tudo levada de roldão pela batalha. Afinal, estava ali também pra isso. Talvez até principalmente por isso!
Na ponte, onde estava, o chão já se encontrava bastante escorregadio em virtude de tanto sangue desvasado. Por várias oportunidades a horda turca ganhara terreno até o mastro principal e, graças a alguns valorosos combatentes, dentre estes a incógnita e enfurecida mulher, tantas quantas vezes vieram, todos os ataques foram rechaçados, sendo empurrados de volta em direção aos costados da capitânia e lançados ao mar, vivos ou convertidos em restos mortais, alimento para a corte de Netuno.
Mas novas abordagens aconteciam, como uma fábrica de guerreiros clone em plena produção, e a visão de D. João ferido no pé dificilmente conseguiria refrear o ímpeto quase suicida dos invasores frente a artilharia que a nau católica desfechava sobre eles. Era questão de pouco tempo para tudo se concretizar.
Quando sobrara somente Aretuza e mais um punhado de artilheiros, cercando o generalíssimo da morte certa, a salvação veio através da intervenção providencial do Marquês de Santa Cruz, repelindo os janízaros e fazendo as embarcações turcas baterem costado contra costado, perdendo mastros pelos tiros a queima-roupa.
O momento crítico deixava suas dúvidas quanto ao resultado do encarniçado combate quando, por volta das quatro da tarde, ocorreu um aviso - não se sabe por quem gritado - dizendo que Pachá recebera reforços e estava voltando novamente à carga, desta feita com força total...
A refrega repetiu-se mais feroz que nunca, as naves se amalgamando, tombando em muito maior número do lado cristão, distribuindo o combate entre as forças no nível de seus diversos tombadilhos e conveses, criando sepulturas sobre o mar que escurecia (e enfurecia) naquele cair de tarde nada convencional.
Dali, com certeza, só os peixes sairiam vencedores.
A libido de Aretuza, naquela desgraçada hora manifesta, via-se extravasada pela neutralização de suas características femininas, expandindo-se em direção do louro comandante que, insuspeito do ataque iminente da pantera, agradeceu pela sucessão de momentos que tinha sido salvo por ele(ela), não sabendo identificar exatamente o motivo por que aquele marinheiro franzino impunha a mão em sua coxa quando, na verdade, era seu pé que inspirava cuidados...
Que ardil seria esse?
Estando ele meio que drogado pela dor e pela tensão do combate, ainda assim foi difícil não perceber o avanço daquelas mãos em direção à sua virilha, não perdendo tempo com admoestações menos viris, sacando de seu punhal que era a estilização do crucificado, um mimo dado pelo próprio Papa, em recepção oficial:
- Rapaz, não sei o que está acontecendo com você, nem quero saber, mas se não parar já com isso - passou o punhal sob o queixo dele(dela). - Por Deus, degenerado, sacrificarei um bom soldado para não ter de testemunhar essa última perversão!!!
Antes que Aretuza pudesse usar suas cordas vocais para perguntar ao outro se ele sabia o que era um preservativo, sentindo uma espécie de gozo fluir de sua prótese perna abaixo, naquele momento crítico do orgasmo uma multidão de otomanos caiu sobre eles. Somente, por reflexo, teve tempo de rolar para o lado e amparar sem número de golpes.
O irmão bastardo do rei não registrou a mesma sorte: Foi arrastado pelos cabelos até os pés de Ali-Pachá e teve ali mesmo sua cabeça separada do corpo, sendo depois fincada no alto duma enorme lança e exibida com clamor para que todos pudessem repercutir seus brados de vitória, fazendo subir a bandeira turca ao mastro da não mais capitânia cristã.
Todavia a mulher, cega de ódio, de quem fora roubada um prazer inexplicável, não aparentou qualquer sinal de derrota, diferente do observado nos demais. E continuava se batendo por sua vida. Aquilo não era uma ilusão, mas tinha sido intensificado pelo tutor alojado em seu nicho sensorial, inculcando nela outra de suas visões, pois para ele não havia questionamentos. A única hipótese aceita para sair derrotada dali era o sacrifício dela própria.
Como a corruptela de um antigo futuro provérbio, ela fazia valer o dito popular "as pessoas podiam não saber por que estavam morrendo, mas ela sabia muito bem por que estava matando". O amor, principalmente o frustrado, tinha dessas coisas, e a espada costumava ser um catalisador bastante adequado; pena que não tivesse acoplado um motor de alta performance para se tornar numa serra elétrica turbinada, fazendo a coisa mais sangrenta!
Informações. Para isso o tutor fora gerado, assumindo o controle quando uma vasta gama de situações acabavam por acioná-lo. Mas também existiam outras armadilhas, além da de ser uma máquina de colher informações, executor orgânico de diretórios suspeitos, enchendo um cesto de frutos que a morte lhe dava, podendo ser este tanto um acessório benéfico, suprativando regiões do cérebro ociosas, quanto fonte constante de execração, principalmente quando atentava contra o usuário...
O cérebro suplementar, conhecido como tutor, parecia trazer alguma informação subliminar, despertando nela um comando no qual a palavra ‘sacrifique-se’ simbolizava muito bem sua razão de ser: no meio de um duelo mortal, no qual Aretuza tinha conseguido até ali despachar algumas cabeças e membros em direção ao mar e tombadilho, um impulso elétrico tomou-a de ligeiras convulsões. Houve como que um petrificamento de seus músculos periféricos, ficando a mercê do que fatalmente viria. Quando mais precisava de sua perícia instintiva, o tutor, nevando-se ao revide, provavelmente articulado por alguma programação de diretório elevado, espalhara aquela corrente de baixíssima resistência mas suficiente para neutralizá-la, tornando-a uma estátua feita de carne, que só conseguiu sobreviver pelos próximos segundos em vista da estranheza de sua posição atual frente ao combate corporal, deixando os 10 turcos, cercando-a, indecisos do que fazer quanto àquilo.
Porém, logo uma espada se abateria, depois outra, para por fim a sua resistência a morte. E nada podia fazer quanto a isso, a não ser observar, lá do fundo de sua carcaça imóvel...
Os sons e imagens chegavam até ela com perfeição, alta fidelidade, nem um pouco amortecidos pela estranha paralisia. Uma forma adicional de sofrimento.
Sabia que morreria e ainda assim nenhum músculo que poderia agir em sua defesa fazia qualquer tipo de espasmo naquela direção. Quando enfim percebeu o movimento de uma espada sendo erguida pelo turco mais próximo, desenhando-lhe no rosto um riso de escárnio, algo dentro dela pareceu se estilhaçar. Por um undécimo de segundo, porém, concomitante ao processo de agressões, houve também algo como se um vidro esfumaçado tivesse sido baixado, quando soube exatamente quem era, porque estava ali e quem tinha sido o autor ou a mando de quem a sabotagem fora feita.
Em suma, tomara conta de seu ser!
- Reitor... você me paga... – desforrando nos mais próximos, ranhou os dentes, voltando como que à vida, de quase vítima passando à algoz, aparando o golpe que visava sua jugular, revidando da mesma forma e deixando, em pouco tempo, mais três cabeças rolando pelo chão, tendo os outros corpos batido em retirada perante aquele demônio que cantava enquanto matava indiscriminadamente, enfurecida.
Todavia ela não ‘cantava’ realmente: Estava provocando um leque de sons de freqüência variada, invocando o traje-robô a vir em seu resgate numa determinada coordenada.
A verdade de sua duplo papel era que podia ser considerada como agente do Poder Messiânico Livre, um organismo contrário a muitas das coisas que os Grandes Empresários e Mestres Maroc vinham fazendo com os humanos desde muito tempo, mesmo antes da subida ao poder, em 2003, do Criador de Janelas. Para tanto, mudando sua identidade, forjando exames de DNA (não forjando o suficiente, pois o reitor da universidade marciana tivera meios de saber com quem estava lidando), tinha até perdido alguns aspectos de sua real aparência para interpretar, naquele dia distante, uma menina de 12 anos. Em verdade, sua real motivação, ao associar-se ao PML, sempre residira na vingança, usando aquele grupo ingênuo de resistência em proveito próprio!
Sendo bisneta do reitor morto em 2050, tinha essa doença (a vingança) borbulhando em seu sangue. Para ser sincera, nem saberia porque aquela justiçagem se tornara tão importante, ao longo dos anos, ao ponto de nortear sua vida inteira. Afinal, nunca conhecera seu antepassado assassinado, mas parecia ser compelida a cada manhã a buscar alguma retratação. Talvez fosse seu passado moleque nas difíceis e agrestes colônias venusianas que moldaram seu caráter combativo; ou escutara as lamúrias de sua avó mestiça por tempo demais, aliada à torta pregação messiânica dos Jovens Guerrilheiros Adventistas do 7o Dia. Fora aos poucos encaminhada na direção dos imunossupressores, a engenharia genética arrematando, completando com a ingestão de ‘complexos de Peter Pan’, contribuindo para que seu crescimento fosse refreado, perdendo, inclusive, alguma massa muscular no local exato onde os estúpidos meninos costumavam observar.
Cronologicamente contava com 16 anos, quando iniciara aquela loucura, porém também sua anatomia precisava de tônus e o freio de seu crescimento tolhido extravasava naquele aumento cíclico em sua libido, verificado anteriormente com o nobre decapitado.
Sabia quem era o assassino, que o diário virtual de seu bisavô apontava como um candidato mais do que provável em caso de uma fatalidade acontecer em breve, e este retribuíra, visando tirá-la de circulação de uma forma banal, sendo mais uma vítima do passado, pois morta, não poderia concluir seu silencioso duelo. Se não tivesse o código implantado que anulou o tutor, arruinando-o talvez definitivamente, restaurando suas lembranças, o êxito do reitor teria sido completo. Restava saber se o traje voador também fora sabotado, uma vez que contra aquilo não haveria remédio...
A batalha se encerrara, bem avançada na direção do dia também em ocaso, sendo o horário mais propício para a contagem dos escombros ardentes em contraste com a crescente escuridão: Quase 50 mil cristão mortos e nenhum prisioneiro. Promessa é dívida!
Um beep monotonal em seu implante auricular provou que ao menos o traje ainda era operacional. Através duma específica torção em sua orelha, sentiu quando seu microvisor embutido foi acoplado ao nervo ótico direito. Viu, com visão telescópica e infravermelha, exatamente o lugar onde o traje precipitou-se no mar e a lá estaria aguardando.
Despencou lá do alto do costado de vante, na direção as águas juncadas de cadáveres, com balas se batendo por toda volta, como uma chuva de chumbo ardente. Ainda que não soubesse na altura daquele Coágulo alterado, a nova história se encarregaria de registrar a saga de um marinheiro que não teve, como os outros, sua morte pelas mãos dos turcos.
Quando sentiu que o traje-robô a agasalhava, as microbombas agindo para expulsar a água salgada do exíguo compartimento intermediário, num momento em que seu fôlego tinha praticamente batido as botas, se entregou, sendo ‘chupada’ para dentro da eclusa de acesso ao móbile. Não perdeu tempo ficando por ali e não tinha dúvida que quando voltasse – se voltasse – as coisas se complicariam para ela...
Esperou, em Gibraltar, o surgimento da próxima janela temporal e se inseriu no duto no exato momento quando este surgiu.
Ao aproximar-se do final daquela fase da aventura, coisa que somente foi registrado nos anais da memoteca da Universidade Marciana pelo retorno das sondas que o traje semeara naquele coágulo, a penúltima dessas mesmas sondas cumpriu sua invisível tarefa: Ficou para sempre modificada (ao menos ali) a versão que os livros continham sobre o relato da ‘visão’ que Pio V, o Papa na época, teria tido em 7 de Outubro de 1571. Se fosse mantida a versão dos livros de História da época-padrão, o mesmo porta-voz da Igreja estaria conversando tranqüilamente sobre problemas financeiros de outra natureza, com seu Tesoureiro, Donato Gesi.
Já na nova seqüência de fatos, mostrava que em vez do êxtase divinatório verificado por ele – tendo a certeza da vitória dos Cruzados em Lepanto - Antonio Chislieri, o papa italiano Pio V, jogara sua mitra no chão e concluíra para o estarrecido ouvinte:
"- Rápido, apressai com o andor! Providencie para que os mais valiosos tesouros de Nossa Santa Madre Igreja sejam embarcados nas galeras o quanto antes. Se possível zarpamos amanhã mesmo!".
"- O que estais a falar, Sumo Pontífice?"
"- Por acaso o demônio já tomou conta de ti, Donato?" – persignou-se, no close dado pela sonda, "- Limita-te a fazer o que vos digo, pois acabamos de perder Lepanto de forma ignominiosa. Os infiéis venceram, escutaste! Eles venceram!! Arrasaram com nossa frota conjunta!! Um anjo que estava fugindo da batalha, junto com seu exército angélico, vai buscar reforços. Enquanto isso, o Sublime Mensageiro de Deus Pai Todo Poderoso aconselhou-me a fazer o mesmo, assim como tu e algumas almas escolhidas..."
Desespero projetado, o resto foi mera rotina. Logo, para o bem ou para o mal, mais um vagão da humanidade saíra do leito de um par de seus trilhos e dormentes temporais.
A última sonda, corroborando aquele ‘fato’, no quarto e último ano de sua estada no passado, circulando por àquela linha de realidade alternativa, acusou mais uma pérola da sobrevivência, somando-se às demais:
Nos livros daquele Coágulo vigorava tudo diferente, desdobrando-se a partir da vitória dos turcos em Lepanto. Os estudos daqueles textos, na nova disciplina de História Comparada Especulativa, se tornara fonte inesgotável de surpresas, pois não sabiam na época, ou se faziam omissos, das forças com que estavam brincando...
Um exemplo disso, pincelado a esmo, fora a tirada do Papa. Outra, que na ‘versão imutável’ da história, falava de um quadro que estivera por muito tempo exibido no Senado veneziano, retratando a vitória dos cristãos com a inscrição em latim "Non virtus nom arma, nom duces, sed Maria Rosarii Victores nos fécit". No coágulo, para regozijo dos estudiosos, o mesmo Senado veneziano, tomado um ano depois de Lepanto pelo exército do Crescente, ostentava, em lugar de honra, o mesmíssimo quadro, até pintado pelo mesmo artista, só que coagido ou subornado por outros patrões, mostrando a batalha de que muitos dos derrotados passaram a apelidar de Le Pranto, só que com uma pequena e fundamental modificação nos dizeres, em muçulmano moderno:
"Nem as tropas, muito menos armas ou comandantes, mas o Leão que comeu as galinhas é que nos deu a vitória!"
Assim o desejo de Solimão III, chamado O Magnífico, de entrar à cavalo na basílica de S. Pedro, em Roma, acabou sendo concretizado por seu filho gay, Selim II, A Gazela.
Outras datas, constadas nos livros alternativos, finalizavam o estudo daquele período, garantindo uma boa nota para Aretuza, ao submeter sua monografia:
1. A Invencível Armada, agregada pelo poder muçulmano que infestava a Espanha, continuava tão invencível como nunca, causando a derrota fragorosa dos ingleses;
2. O Brasil - que se a história fosse a mesma seria anexado à Espanha somente em 1580 - com a conquista de Portugal, mudava antecipadamente de dono e nome, sendo que várias expedições, levando camelos para o nordeste brasileiro, passaram a considerá-lo como Saara das Américas.
O autor é escritor de FC, natural do Rio de Janeiro. Publicou Campus de Guerra (editora Writers, 1999), de onde o conto "Le Pranto" é derivado. Participou de diversas antologias. É co-editor da Revista Scarium e diretor do Projeto Editorial Alternativo SLEV
Contatos: rogamvas@radnet.com.br
Projeto Editorial Alternativo: SLEV
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