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Neste boletim publicamos o conto Os Ventos do
Urrador do escritor Henry Evaristo uma história
fantástica, de um pai andando com o filho pelos campos
de sua propriedade e revelando antigos segredos.
http://www.casadacultura.org/Literatura/Contos/gr2/ventos_hurrador_henry.html
Outubro foi um mês dedicado exclusivamente à
Literatura. No site você encontrará muito material
novo de qualidade: contos, poesias, crônicas, e outros
gêneros. Seguem abaixo alguns links:
O que se espera de um Poeta: é
um texto de um dos mais novos amigos da Casa, Paulo
Cezar dos Santos, que está na Seção
Artigos e Poesias sobre o tema: "O que é Poesia?":
http://www.casadacultura.org/Literatura/Poesia/O_que_e_Poesia_Artigos/oque_se_espera_de_um_poeta.html
Nas margens do Rubicão conto de Otávio
Nunes: escritor e jornalista que escreve suas histórias
de um jeito simples mas envolvente.
http://www.casadacultura.org/Literatura/Contos/gr2/margens_do_rubicao.html
Conheça também as crônicas do mesmo autor
na Seção de Crônicas:
http://www.casadacultura.org/Literatura/Cronicas/gr01/lili_erva_doce_otavio_nunes.html
http://www.casadacultura.org/Literatura/Cronicas/gr01/sinais_tempo_otavio_nunes.html
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a seus amigos e conhecidos.
Obrigado.
Os Ventos do Urrador
Henry Evaristo
Na tarde em que os primeiros ventos gélidos do inverno sopraram
das cordilheiras de Haszdan caminhei com meu velho pai pelos
campos e morros de nossa ancestral propriedade. O cinzento
do dia e a fina camada de água que nos atingia, umedecendo
nossos rostos alvos e nossas vestes negras, nos impeliam a
falar de fantasmas e monstros. Como era agradável estar de
volta àquele lugar na companhia de uma figura tão majestosa
como a daquele ancião encurvado e encarquilhado, ouvindo as
velhas estórias que um dia acarinharam e embalaram as noites
dos meus tempos de criança! No entanto, agora, os lábios ressecados
e encolhidos deste senhor não traziam mais palavras imbuídas
da mesma segurança aconchegante de outrora quando o fogo ardendo
na lareira, de onde chegava o suave crepitar da madeira que
ardia, ou as pesadas portas de carvalho com tramelas, nos
separavam das coisas negras do mundo. Antes de tudo, suas
frases emanavam no ar sensações macabras; sentenças de medo
sobrenatural.
De seres malditos falou meu pai em meio a tarde invernal.
Criaturas monstruosas habitantes dos poços e bosques que nos
rodeavam; comedores de carnes e almas humanas que se arrastavam
e se espojavam encobertos pelas trevas e brumas dos pântanos
longínquos. Coisas negras, amortalhadas e flácidas que saltavam
de suas tocas, fossas e abismos para avançarem sobre os cadáveres
decompostos dos cemitérios da região no esquecimento da noite,
na escuridão.
Ai de mim! Jamais poderei esquecer aquela tarde em que o
frio parecia me envolver como o abraço da morte que vai penetrando
a pele e, esmigalhando ossos e órgãos, avança como um verme
dos lamaçais pútridos do Tártaro*.
"Menino!" Disse o velho quando atingimos o cume
de uma elevação cujos limites chocavam-se abruptamente com
uma lúgubre floresta de árvores negras retorcidas. “Quero
hoje, agora que já me encontro no fim desta existência terrena,
que você conheça um pouco dos mistérios do lugar em que nasceu".
Dito isso, olhou ao redor parecendo então concentrar as vistas
em algum ponto perdido no horizonte. Depois, agarrando meu
braço com suas débeis mãos, fez sinais para que sentássemos
no chão. Enquanto um sol pálido e encoberto começava a rumar
para o firmamento enregelado e uma neblina espessa surgia
vindo, quem sabe, dos confins dos bosques, ele suspirou e
começou:
"Neste lugar, ao qual chamam floresta Malgred, habitam,
desde tempos imemoriais, forças que estão além da compreensão
e da aceitação humanas. São seres malévolos, visíveis ou não,
que se esgueiram livremente por entre as árvores e no fundo
das cavernas mais profundas. Alguns estão aqui por opção e
se mantém reclusos e quietos, porque em exílio ou retiro,
mas outros, os que foram trazidos à força de suas insondáveis
vastidões infernais, estes não têm e não querem paz. São os
diabólicos resultados dos feitiços e das conjurações deste
povo oriental que aqui se estabeleceu quando estas matas escuras
ainda dominavam toda a região. Estes, sim, são malévolos!
Coisas demoníacas que se escondem dos vivos e a estes odeiam
tanto que desenvolveram, ao longo dos séculos, um apetite
voraz por suas carnes. Você mesmo ouviu em sua infância as
inúmeras estórias sobre os diabos dos bosques de Zalees; esta
nossa famigerada cidade que foi criada sob as cinzas das maldições
da santa inquisição. Pois eu lhe asseguro, agora que já não
tenho muito mais pelo que esperar e o fardo deste maldito
conhecimento me fustiga as costas como nunca: Estas abominações
são todas reais e estão aqui, agora, nos rodeando e nos espreitando
como um leão faminto nas savanas da África. E nós somos suas
presas, todos nós, os humanos, pois seu poder quer emanar
daqui para o mundo e, para isso, espera apenas o tempo correto."
“Ouça!" Disse meu pai voltando-se novamente para
as negras matas distantes que desciam das cordilheiras enevoadas,
de onde brotava agora uma estranha ventania. Continuou, então,
num tom desolador. " Estes ventos são para nós. Sopram
das más intenções destes lugares esquecidos. São os ventos
do urrador que chegam a açoitar nossos cabelos. E só isso
basta para que nos tornemos parte de sua maldade."
De repente vi estender-se no céu uma terrível mancha escura
e como que uma pressão absurda atacou meus ouvidos. Do lado
oriental de toda aquela imensidão fria vinha, agora, trazida
pelo ar, uma espécie de voz lamurienta; como se fossem milhares
de criaturas em terrível agonia que se auto-comiseravam em
uníssono.
Olhei apavorado para o velho e ele estava, ao mesmo tempo,
sorrindo e chorando. E de seu lábios ressecados pelo tempo
e pelo horror pareciam saltar curtas palavras que para mim
soavam desconexas e sem sentido ao passo que para ele pareciam
ensejar uma espécie de rito ou oração visto que, ao pronunciá-las,
fazia sinais mágicos com as mãos em riste. Eu, atônito, começava
a sentir toda a minha racionalidade explodindo diante do impossível
enquanto que do céu medonho parecia baixar sobre nossas cabeças
o presságio de mil caretas de demônios escondidas por entre
as nuvens.
Sem saber o que fazer, dobrei os joelhos e juntei-me ao ancião,
quase caindo sobre sua figura magra e abatida. Porém, ao procurar
aproximar meus ouvidos de seus lábios, a fim de tentar entender
o que ele apenas balbuciava, seu hálito atingiu em cheio meu
rosto provocando uma inevitável onda de náuseas junto com
uma constatação terrível que me destruiu por completo. Uma
baforada fétida, de coisas hediondas em decomposição, era
o que brotava da fenda escura que se tornara sua boca, e seus
lábios, antes apenas pálidos, estavam agora roxos e intumescidos,
com um aspecto flácido merecedor do mal-cheiro que exalava.
Não era mais meu pai, aquela coisa que diante de mim se prostrava.
E vi quando de suas costas saltou um bando asqueroso de vermes
que pareciam brotar como uma praga das bordas de sua camisa.
Aquela criatura limitou-se a lançar-me um olhar malicioso;
uma expressão tão horrenda de sarcasmo e malevolência se estampara
em seu semblante que mal pude manter-me encarando-a. Foi quando
me voltei para o lugar de árvores retorcidas e avistei, parada,
ao longe, uma figura de pesadelo. Envolta em neblinas que
desciam de cordilheiras distantes e espectrais, parecendo,
ela mesma, tão terrível quanto tudo o que eu já ouvira naquela
tarde, estava uma sombra imensa, parada na borda da floresta
como alguma divindade que saltasse de bosques oníricos para
assaltar o mundo dos mortais. No mesmo instante tive plena
certeza de que era dela que brotava o lamurio vindo com o
vento.
Subitamente senti um puxão em minhas roupas e o apertar de
mãos vacilantes se fechando em torno de meu braço. Virei-me
e lá estava de volta meu velho pai, caído ao chão e tentando
sofregamente buscar ar em seus pulmões combalidos. Atirei-me
sobre ele tentando desesperadamente ajudá-lo a respirar, mas
tudo o que fiz restou em vão, pois sua vida não mais a este
mundo pertencia. Sua hora chegara ali, naquele lugar condenado
e esquecido, onde coisas execráveis faziam suas tocas e esperavam
pacientes a hora certa para imporem suas vontades.
Como um animal assustado meu pai olhou-me nos olhos e até
hoje suas últimas palavras retumbam em meus ouvidos deixando-me
com os nervos abalados em noites em que o vento sopra e assobia
nos cantos escuros e carcomidos das paredes da nossa antiga
propriedade.
"Agora sois quem guarda o segredo destas matas. É tua
a obrigação de guardá-lo bem e transferi-lo aos teus para
que nunca se aventurem pelos bosques remotos. Quando as coisas
vierem, no meio da madrugada nevoenta, elas procurarão primeiro
o portador deste conhecimento maldito e, sejas tu ou teu filho
ou teu neto, deve estar pronto a servi-las como está predito,
por força de maldição, no inferno. Este é o desígnio que te
passo, ó filho meu, com pavor e por obrigação, pois te digo,
agora que o oblívio já me alcança, que aqueles velhos feiticeiros
orientais que abriram as portas deste mundo às potências do
inferno eram também meus ancestrais."
Dito isso, se foi o homem e restei eu, agora único sobre
esta terra a sustentar o abominável fardo. Mesmo passados
trinta anos daquela tarde invernal, por trás de meus olhos
cansados ainda se esgueira a imagem da terrível aparição;
A sombra horrenda que sorriu para mim de seu recanto na floresta
e depois me deu as costas para voltar ao interior escuro dos
bosques deixando atras de si um rastro de árvores retorcidas.
Ainda me doi a cabeça ao lembrar de sua careta diabólica reproduzida
nas faces mortiças de meu ente mais querido.
Hoje estou velho e meu neto brinca inocentemente nos jardins
cinzentos. Em breve terei de partir, mas antes devo levá-lo
até as colinas e contar-lhe o que um dia me foi contado passando-lhe
assim a maldição que se abate sobre nossa miserável família.
Às vezes avisto sombras correndo por onde ele corre e figuras
malignas saltando por onde ele salta. Estará se aproximando
a hora fatídica dos homens do mundo? Estará chegando o dia
da divisão desta terra com as entidades imundas? Em breve
será entre nós o urrador das matas e poços; A coisa negra
das missas sacrílegas. Ainda estaremos aqui quando vierem
e, por certo, não teremos para onde fugir. Nos subjugarão
e apavorarão. E comerão nossas almas.
*- Tártaro: inferno mitológico grego
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