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Artigo de André Masini publicado no Jornal O Paraná em 06/Ago/2003


MINHA IDA AO JÔ


André C S Masini


Antes de contar a história de minha entrevista com o Jô Soares, exibida em 13/06/03, devo esclarecer um detalhe:

Não tenho qualquer propensão natural para aparecer na televisão. Sou escritor e acredito que os livros – expressão escrita e direta da alma humana – valem por si próprios e não deveriam precisar da "validação" de qualquer outro meio de expressão ou veículo de comunicação. Ocorre que, no mundo de hoje, para dar vida (leitores) a meus escritos, foi necessário expô-los na mídia... e foi nesse processo que acabei chegando ao Jô.

Inicialmente falei com a simpática e brilhante jornalista Renata Hydalgo, da Globo: pessoa de vasta cultura e espírito flexível. Conversamos ao telefone por duas horas e ela deu sinal verde para minha entrevista. "Meu" programa seria gravado no dia 10/06, junto com M. Falabella e Cláudia Gimenez. Antes do nosso, seria gravado outro programa, com um certo "especialista em Vaticano" e com dois transformistas: os únicos irmãos gêmeos drag queens do Brasil.

Os detalhes de minha viagem foram organizados por um produtor chamado Dinho, a quinta-essência da eficiência. Dinho elimina imprevistos e faz o entrevistado estar lá: no lugar certo, na hora certa.

Minha viagem foi como um estalar de dedos: do instante em que me apanharam na porta de minha casa em Cascavel, até quando me vi dentro do estúdio da Globo em São Paulo, tudo aconteceu no "piloto automático"... Fosse eu um neandertal, teria chegado lá do mesmo jeito...

Lá dentro, o sistema de acompanhamento continuou. Em todos os instantes, por todos os lugares onde estive, sempre houve a meu lado alguém me conduzindo: sujeitos munidos de rádio, fone, bipe, cronômetro e outros aparelhos que não faço a menor idéia de para que servem. Um me levava até um ponto onde outro já me esperava, este me conduzia por corredores e salas repletos de cabos e aparelhos, cruzávamos com gente de todos os tipos: técnicos, produtores, atores vestindo roupas brilhantes...

Passamos pela belíssima sala do Jornal da Globo e chegamos a um laboratório para digitalizar fotos, de lá me levaram para o técnico que colocaria meu microfone (todos aqueles desconhecidos pareciam saber quem eu era)... e assim, de sala em sala, de acompanhante em acompanhante, fui sendo arrastado... até que:

Lá estava eu, no auditório do Programa do Jô. A três metros de mim estava ninguém menos do que o próprio gordo... sorrindo e brincando, carismático como sempre.

Colocaram-me em um lugar reservado na segunda fila da platéia. À minha direita, na fila da frente, estavam duas enormes freiras...

Estranhas freiras! Deveriam ser as tais especialistas em Vaticano... Mas (curioso!) eu ouvira claramente o Dinho dizer que o tal "especialista" seria um homem...

O Jô chamou as "freiras". Elas se levantaram e com a maior desenvoltura avançaram, rebolando e atirando beijinhos ao público... Eta igreja! Cada dia mais moderna!

Tão desorientado estava eu (batendo palmas ao som do sexteto), que nada mais deveria me espantar... mas aí as freiras começaram a tirar os hábitos e a exibir corpos musculosos... sob curtíssimos biquínis de Mulher Maravilha...

Eram os dois irmãos drag queens. Mas só entendi isso quando Jô os dispensou e chamou o verdadeiro especialista em Vaticano: um magro e circunspecto senhor de terno...

De repente... era minha vez! Lá estava eu, sério e sem graça, sob as luzes.

Em minha mente, as sinuosas salas por onde eu passara pareciam o labirinto de Creta; e as câmaras que me fixavam, o próprio Minotauro. Mais do que nunca, esta pobre criatura que lhes escreve, saída da quietude das bibliotecas, compreendeu que aquela não era sua selva.

Mas, para minha sorte, aquela selva tem seu bwana... E só o conhecendo de perto para entender quanta perspicácia e gentileza existem naquele gordo...

O contato inicial criou uma certa estranheza... ele não me conhecia, e mal sabia quem eu era... Mas me fitou com aqueles olhos que não deixam escapar nada... E quando eu me dei conta a entrevista já tinha acabado, e eu tinha realmente me sentido em casa! como se tivesse estado com um velho amigo, conversando velhos assuntos...

Sim. No final deu tudo certo. Mas que meus outros velhos amigos não se enganem... Se eu pareci estar à vontade, foi porque o bwana de lá conseguiu magicamente, em um relance, perceber que tipo de pessoa eu era, e teve a finíssima gentileza de me fazer sentir em casa...

 

O autor é  Escritor, Auditor Fiscal da Receita Federal
e Diretor Geral da Casa da Cultura
.

 

[Veja as fotos dessa entrevista e a sinopse publicada pela Rede Globo]
[Leia a mensagem de agradecimento que André Masini escreveu para o Jô e sua equipe]

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